quarta-feira, 19 de junho de 2013

                                    Como funciona a energia nuclear
As usinas nucleares fornecem cerca de 16% da eletricidade do mundo (dados de agosto de 2008). Alguns países dependem mais da energia nuclear para obter eletricidade que outros. Na França, por exemplo, cerca de 75% da eletricidade é gerada a partir da energia nuclear, de acordo com a Agência Internacional de Energia Atômica (em inglês). Nos Estados Unidos, a energia nuclear fornece 23% da eletricidade total, mas alguns Estados obtêm mais energia de usinas nucleares que outros. No Brasil, menos de 3% da energia gerada tem origem das usinas nucleares de Angra dos Reis. Há mais de 400 usinas de energia nuclear ao redor do mundo, sendo mais de 100 nos EUA.(Fonte: WNA, em inglês)


A edificação de contenção, em formato de domo, da Usina Nuclear de Shearon Harris, perto de Raleigh, Carolina do Norte
Você já imaginou como uma usina de energia nuclear funciona ou o quão segura ela é? Neste artigo vamos analisar como um reator nuclear e uma usina de energia funcionam e vamos explicar a fissão nuclear, mostrando um reator nuclear por dentro.
Urânio
urânio é um elemento bastante comum na Terra, incorporado ao planeta durante sua formação. O urânio é formado originalmente nas estrelas. Estrelas antigas explodiram, e a poeira dessas estrelas despedaçadas se agregou para formar nosso planeta. O urânio-238 (U-238) tem uma meia-vida extremamente longa (4,5 bilhões de anos), e portanto ainda está presente em quantidades bem grandes. O U-238 compõe 99% do urânio no planeta. O U-235 compõe cerca de 0,7% do urânio remanescente encontrado naturalmente; o U-234, ainda mais raro, é formado pelo decaimento do U-238. O urânio-238 passa por muitos estágios, ou decaimento alfa e beta, para formar um isótopo (em inglês) estável de chumbo, e o U-234 é um elo nessa corrente.
O urânio-235 tem uma propriedade interessante que o torna útil tanto para produção de energia nuclear quanto para a produção de uma bomba nuclear. O U-235 decai naturalmente, assim como o U-238, por radiação alfa, e também sofre fissão espontânea por um pequeno percentual do tempo. Contudo, o U-235 é um dos poucos materiais que podem sofrer fissão induzida. Se um nêutron livre atravessar um núcleo de U-235, o núcleo absorverá o nêutron sem hesitação, se tornará instável e se dividirá imediatamente. 

A animação abaixo mostra um núcleo de urânio-235 com um nêutron se aproximando a partir do topo. Assim que o núcleo captura o nêutron, ele se divide em 2 átomos mais leves e arremessa 2 ou 3 nêutrons novos (o número de nêutrons ejetados depende de como o átomo de U-235 se divide). Os 2 novos átomos então emitem radiação gama conforme se ajustam em seus novos estados. Há 3 coisas sobre esse processo de fissão induzida que o tornam especialmente interessante:
 
  • a probabilidade de um átomo de U-235 capturar um nêutron de passagem é muito alta. Em um reator funcionando adequadamente (conhecido como estado crítico), um nêutron ejetado de cada fissão ocasiona outra fissão;
  • a processo de captura do nêutron e divisão acontece muito rapidamente, na casa dos de picossegundos (1x10-12 segundos);
  • uma inacreditável quantidade de energia é liberada, na forma de calor e radiação gama, quando um único átomo se divide. Os dois átomos que resultam da fissão posteriormente liberam radiação beta e radiação gama de si mesmos. A energia liberada por uma única fissão resulta do fato de que os produtos da fissão e os nêutrons, juntos, pesam menos que o átomo original de U-235. A diferença no peso é convertida diretamente em energia na taxa regulada pela equação E = mc2.
    Algo na ordem de 200MeV (milhões de elétron-volts) é liberado pelo decaimento de um átomo de U-235 (se você quiser converter isso em algo útil, considere que 1 eV é igual a 1,602 x 10-12 ergs;1 x 107 ergs equivalem a 1 joule; 1 joule é igual a 1 watt-segundo, e 1 BTU é igual a 1.055 joules). Isso pode não parecer muito, mas há muitos átomos de urânio em meio quilo de urânio. Tantos, na verdade, que meio quilo de urânio altamente enriquecido como o usado para fornecer energia a um submarino nuclear ou porta-aviões nuclear equivale a aproximadamente 3,8 milhões de litros de gasolina. Considerando que meio quilo de urânio ocupa menos espaço que uma bola de beisebol, e que 3,4 milhões de litros de gasolina encheriam um cubo de 15 m de cada lado (15 m é a altura de um edifício de 5 andares), você pode ter uma idéia da quantidade de energia disponível em um pequeno volume de U-235.
Para que essas propriedades do U-235 funcionem, uma amostra de urânio deve ser enriquecida de modo que contenha de 2% a 3% ou mais de urânio-235. O enriquecimento de 3% é suficiente para o uso em um reator nuclear civil usado para geração de energia. O urânio destinado a armas é composto de 90% ou mais de U-235.
Dentro de uma usina de energia nuclear
Para construir um reator nuclear você precisa de um punhado de urânio levemente enriquecido. Normalmente, o urânio é formado em péletes (que tem a forma de uma pílula) com aproximadamente o mesmo diâmetro de uma moeda de 10 centavos e mais ou menos 2,5 cm de espessura. Os péletes são dispostos em hastes longas agrupadas em feixes. Os feixes são normalmente submersos em água dentro de um recipiente de pressão. A água atua como refrigerante. Para que o reator funcione, o feixe, submerso em água, deve ser levemente supercrítico. Isso significa que se deixado sozinho o urânio eventualmente superaqueceria e derreteria.
Para evitar isso, as hastes de controle feitas de material que absorve nêutrons são inseridas no feixe usando um mecanismo que pode elevar ou abaixar as hastes de controle. Elevar ou abaixar as hastes de controle permite que os operadores controlem o índice de reação nuclear. Quando um operador quer que o núcleo de urânio produza mais calor, as hastes são elevadas para fora do feixe de urânio. Para criar menos calor, as hastes são abaixadas dentro do feixe de urânio. As hastes podem ser abaixadas completamente no interior do feixe de urânio para desligar o reator no caso de um acidente ou para trocar o combustível.
 
O feixe de urânio atua como uma fonte de calor de altíssima energia. Ele aquece a água, que se transforma em vapor, acionando uma turbina a vapor, a qual faz girar um gerador para produzir energia. Em alguns reatores, o vapor do reator atravessa um trocador de calor secundário e intermediário para converter a água de outro circuito em vapor, que aciona a turbina. A vantagem desse desenho é que a água/vapor radioativo nunca entra em contato com a turbina. Também, em alguns reatores, o fluido de resfriamento em contato com o núcleo do reator é um gás (dióxido de carbono) ou metal líquido (sódio, potássio); esses tipos de reatores permitem que o núcleo seja operado a temperaturas mais altas.

Massa crítica: a usina nuclear em funcionamento

Depois do reator há pouca diferença entre uma usina de energia nuclear e uma usina de energia a carvão ou óleo, exceto pela fonte do calor usada para criar o vapor.


Este gerador na usina Shearon Harris produz 870 megawatts, eletricidade usada em residências e empresas 


Tubos transportam vapor para abastecer o gerador na usina de energia
O recipiente de pressão do reator é normalmente alojado dentro de um revestimento de concreto que atua como um escudo contra radiação. Esse revestimento é alojado dentro de um recipiente de contenção de aço muito maior. Esse recipiente contém o núcleo do reator, bem como o maquinário (guindastes, etc.) que permite que os trabalhadores na usina reabasteçam e mantenham o reator. O recipiente de contenção de aço tem o objetivo de evitar o vazamento de gases ou fluidos radioativos da usina.
Finalmente, o recipiente de contenção é protegido por um edifício de concreto externo que é forte o suficiente para sobreviver a coisas como a queda de aeronaves. Essas estruturas de contenção secundárias são necessárias para evitar a saída de radiação/vapor radioativo no caso de um acidente como o da Three Mile Island (em inglês). A ausência de estruturas de contenção secundárias em usinas de energia nuclear russas permitiu que material radioativo escapasse no acidente em Chernobyl (em inglês).


O vapor sobe da torre de refrigeração na usina Harris


Trabalhadores na sala de controle na usina de energia nuclear podem ficar de olho no reator nuclear e tomar alguma iniciativa se algo sair errado
O urânio-235 não é o único combustível possível para uma usina de energia. Outro material fissionável é o plutônio-239, que pode ser criado facilmente bombardeando-se o U-238 com nêutrons - algo que acontece o tempo todo em um reator nuclear.
Subcriticalidade, criticalidade e supercriticalidade
Quando um átomo de U-235 se divide, desprende 2 ou 3 nêutrons (dependendo do modo como o átomo se divide). Se não houver outros átomos de U-235 na área, então esses nêutrons livres voam para o espaço como raios de nêutrons. Se o átomo U-235 é parte de uma massa de urânio - então há outros átomos de U-235 próximos - então acontece uma destas 3 coisas:
  • se, na média, exatamente um dos nêutrons livres de cada fissão atingir outro núcleo de U-235 e fizer com que se divida, então a massa de urânio é considerada crítica. A massa existirá em uma temperatura estável. Um reator nuclear deve ser mantido em estado crítico;
  • se, em média, menos de um dos nêutrons livres atingir outro átomo de U-235, então a massa é subcrítica. Eventualmente, a fissão induzida terminará na massa;
  • se, em média, mais de um dos nêutrons livres atingir outro átomo de U-235, então a massa é supercrítica. Ele se aquecerá.
Para uma bomba nuclear, o projetista da bomba quer que a massa de urânio seja muito supercrítica, de modo que todos os átomos de U-235 na massa se dividam em um microssegundo. Em um reator nuclear, o núcleo do reator precisa ser levemente supercrítico, de modo que os operadores da usina possam elevar e abaixar a temperatura do reator. As hastes de controle dão aos operadores um modo de absorver nêutrons livres de forma que o reator possa ser mantido em um nível crítico.
A quantidade de urânio-235 na massa (o nível de enriquecimento) e o formato da massa controlam a criticalidade da amostra. Você pode imaginar que se a forma da massa for uma folha muito fina, a maioria dos nêutrons livres voará para o espaço em vez de atingir outros átomos de U-235. Umaesfera é o formato ótimo. A quantidade de urânio-235 que se deve juntar em uma esfera para obter uma reação crítica é de cerca de 900 gramas. A quantidade portanto é mencionada como massa crítica. Para o plutônio-239, a massa crítica é de cerca de 283 gramas.
O que pode sair errado
Usinas de energia nuclear bem construídas têm uma importante vantagem no que se refere à geração de energia elétrica - são extremamente limpas. Comparadas com uma usina de energia a carvão, as usinas de energia nuclear são um sonho que se torna realidade de um ponto de vista ambiental. Uma usina de energia a carvão na verdade libera mais radioatividade na atmosfera que uma usina de energia nuclear funcionando adequadamente. As usinas a carvão também liberam toneladas de carbono, enxofre e outros elementos para a atmosfera (consulte esta página para mais detalhes).
Infelizmente, há problemas significativos com usinas de energia nuclear:
  • extrair e purificar urânio não tem sido, historicamente, um processo muito limpo;
  • usinas de energia nuclear funcionando inadequadamente podem criar grandes problemas. O desastre de Chernobyl (em inglês) é um bom exemplo. Chernobyl foi inadequadamente projetada e impropriamente operada, mas mostra dramaticamente o cenário do pior caso. Chernobyl espalhou toneladas de poeira radioativa na atmosfera;
  • o combustível gasto nas usinas de energia nuclear é tóxico por séculos e, ainda, não há instalação de armazenamento permanente e segura para ele;
  • o transporte de combustível nuclear para e das usinas apresenta algum risco, embora até hoje, o registro de segurança nos Estados Unidos tenha sido bom.
Esses problemas suprimiram grandemente a criação de novas usinas de energia nuclear nos Estados Unidos. A sociedade parece ter decidido que os riscos sobrepujam as recompensas.

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